Como a política afeta o futebol, e vice-versa

Ninguém duvida da paixão enorme que o povo Brasileiro nutre pelo futebol, mas não é apenas da paixão que um povo consegue se tornar referência mundial em qualquer coisa – também é necessário oportunidades e condições para os jovens com grande potencial no esporte se dedicarem em horário integral desde cedo. Para conseguir essas condições, investimentos consideráveis e duradouros são necessários. Por muito tempo investimentos privados monopolizaram essa função, mas principalmente depois da constituição de 1988 e a criação do Ministério do Esporte em 2003 o estado assumiu um papel importante nesses investimentos. Muitas vezes as empresas privadas investem valores mais altos, mas em troca exigem condições rígidas dos atletas e, caso o investimento se torne desvantajoso, existe o risco da empresa retirar o investimento. A importância das políticas públicas voltadas para o futebol e esportes em geral é vital para garantir esse investimento mais ao longo prazo, com consistência, dando uma maior segurança para o atleta focar no que realmente importa – no jogo.

Atleta

Bolsa Atleta

Um exemplo de política pública eficaz que auxilia não apenas jogadores de futebol promissores mas também esportistas de várias outras categorias como Ginástica artística ou até mesmo esportes olímpicos é a Bolsa Atleta. O programa foi iniciado em 2005 e continua válido até hoje, embora com investimento reduzido ao longo dos anos e precisando urgentemente de uma revisão dos valores repassados para os atletas, que com a inflação dos últimos anos se tornou quase uma mixaria para os atletas em início de carreira, chamados pelo programa de atletas de base. O valor da bolsa para essa categoria de atletas é de 370 reais, menos que 1/3 do salário mínimo, que já não rende muita coisa em 2022.

É claro que para ser beneficiado pela bolsa atleta o cidadão precisa cumprir requisitos mínimos. Além disso a bolsa dura 1 ano, sendo preciso renová-la a cada ano, podendo também ser retirada em situações de rendimento aquém do esperado. Os requisitos mínimos para a bolsa de 370 R$ de atleta de base são: Ter entre 14 e 19 anos de idade, estar vinculado a algum clube esportivo e ter participado de algum campeonato no ano anterior ao da bolsa e ter conquistado o primeiro, segundo ou terceiro lugar de uma competição. Já para a Bolsa de 925 R$, que é a categoria de atleta nacional, o atleta precisa ter participado do evento nacional mais importante do seu esporte, no caso do futebol, campeonatos da CBF. E obtenha a colocação de primeiro, segundo ou terceiro lugar.

Lei das loterias

Outra política pública extremamente importante para o investimento do futebol no Brasil é a lei das loterias. Também conhecida como Lei Pelé em homenagem ao rei do futebol, a lei de número 9.615, sancionada em 1998 estabelece, entre outras diretrizes, fontes de renda para o orçamento direto que será investido no futebol oriundo de uma porcentagem fixa das lotéricas da caixa. Em especial a timemania e a loteca, que foram criadas com essa função em mente. Esse repasse ajuda na parte orçamentária de muitos projetos de investimento no futebol no Brasil, inclusive no orçamento anual da Bolsa Atleta.

O esporte com função de redução da pobreza

Para pessoas que não tiveram muitas oportunidades de estudo, mas que são dedicadas e possuem paixão pelo futebol, o esporte pode servir de uma forte alavanca de ascensão social e tirar não só o atleta mas também os seus familiares da pobreza. No esporte, todos estão em igualdade, não importa se um é estudante de mestrado e o outro é gari. Além de dar oportunidades essenciais para o atleta, o futebol insere valores vitais que precisam ser internalizadas para se obter sucesso, como trabalho em equipe, determinação e valorização do esforço. Além disso, o atleta dedicado tem muito menos chances de terminar no mundo do crime ou das drogas, por ter objetivos de vida e uma rotina rígida.

impacto do futebol na política

O impacto do futebol na política

Vimos acima que políticas públicas são extremamente necessárias para o crescimento do futebol no país, porém às vezes temos a oportunidade de ver o caminho inverso : O futebol como motor político.

Um exemplo histórico é aquele da Democracia Corinthiana. O movimento era liderado pelos jogadores apoiados pela diretoria do time e foi criado com o objetivo de lutar pela volta da democracia do Brasil nos anos 80, depois que o Brasil já estava se aproximando da segunda década de uma ditadura militar.

Além de se posicionarem abertamente a favor da Democracia, o time decidiu liderar por exemplo e tornar a estrutura interna do time uma verdadeira democracia, com votações onde os jogadores tinham voz sobre decisões importantes como quem contratar e até mesmo sobre os salários dos membros. Uma figura marcante nesse movimento, com muita dedicação de corpo e alma foi o jogador Socrates

Além de adicionar frases de efeito pró-democráticas como “Diretas Já”, “dia 15 vote” e “Quero votar para presidente”. Uma das ações mais memoráveis foi logo antes da final do campeonato paulista de 1983, os jogadores entraram em campo segurando a faixa que dizia : “ganhar ou perder, mas sempre com a democracia”.

Ato político recente em 2022

Não foi apenas no passado que o futebol influenciou a política nacional. Após a tensa eleição de 2022 entre Lula e Bolsonaro, vários manifestantes que acreditavam que a urna havia sido fraudada (sem prova alguma, por sinal) decidiram bloquear as rodovias mais importantes do Brasil. No total foram mais de 500 bloqueios ao longo da semana após as eleições. A polícia não tinha muito interesse em parar essas manifestações ilegitimas, mas quando as torcidas organizadas de diversos times, inclusive a do Corinthians, chegaram nesses bloqueios com objetivo de ir assistir os últimos jogos do Brasileirão 2022, os torcedores botaram os manifestantes para correr, acabando com dezenas de bloqueios ao redor do país que nem mesmo a polícia tinha conseguido ainda. Alguns dos torcedores postaram vídeos em redes sociais defendendo a democracia ao quebrar esses bloqueios, uma coisa bonita de se ver.

Conclusão

A política é um fator importante na valorização e crescimento do futebol no Brasil e também um importante pilar no treinamento das próximas gerações com suas políticas públicas que devem ser valorizadas. Além disso, a política não opera em um vácuo, sendo também afetada por movimentos que ela mesmo ajudou a criar. Assim podemos afirmar que política e futebol não se separam, mas é claro que devemos saber separar qual o lugar de cada um. Dentro dos 90 minutos, em campo, por exemplo, quem deve falar mais alto é o futebol, e isso é indiscutível.